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Qual seria o impacto da revisão de patrocínios de estatais na cultura do RS

Biblioteca Pública do Estado, em Porto Alegre, entregou em 2015 obra de restauro com verba do BNDES Bruno Alencastro / Agencia RBS Par...


Biblioteca Pública do Estado, em Porto Alegre, entregou em 2015 obra de restauro com verba do BNDES
Bruno Alencastro / Agencia RBS


Para entender a dimensão dos investimentos estatais na cultura do Rio Grande do Sul, em suas diferentes modalidades, é preciso olhar para trás. Feira do Livro de Porto Alegre, Bienal do Mercosul, Festival de Cinema de Gramado, Jornada de Literatura de Passo Fundo, Porto Alegre Em Cena: todos esses e outros eventos contaram em algum momento com patrocínios públicos, assim como a área de patrimônio histórico e cultural.

A Biblioteca Pública do Estado, em Porto Alegre, teve autorização para captar R$ 7 milhões, pela Lei Rouanet, para o restauro e a modernização do prédio, mas só conseguiu efetivamente R$ 2,5 milhões, aportados pelo BNDES, além de um complemento de R$ 65 mil do Sinduscon. A obra foi entregue em 2015 com a recuperação de pisos e aberturas, e tendo resolvido problemas de infiltração.

Diretora da Biblioteca Pública, Morganah Marcon estima que ainda sejam necessários R$ 9 milhões em melhorias, orçamento que será desmembrado em projetos menores para facilitar a captação. O PPCI e a modernização das instalações elétricas serão buscados em um edital do BNDES. O restauro do mobiliário deverá virar um projeto pela Lei Rouanet no segundo semestre.

— Lamento que cada vez menos se investe na cultura. De uns anos para cá, reduziu muito o número de editais. Várias entidades lançavam editais todos os anos — lamenta Morganah.

Outro exemplo de visibilidade a partir do patrocínio estatal é a Cinemateca Capitólio Petrobras, cinema de rua que ostenta o nome da petrolífera em sua fachada na esquina da Demétrio Ribeiro com a Borges de Medeiros, no Centro Histórico da Capital. A sala foi reinaugurada em 2015 após mais de 10 anos de obras no prédio, restaurado com R$ 4 milhões da Petrobras e R$ 1,1 milhão do BNDES. O Capitólio pôde digitalizar seu equipamento de projeção e realizar uma programação especial em 2017 com R$ 738 mil da Petrobras. Uma programação para 2019 está sendo viabilizada com outro contrato de R$ 590 mil da Petrobras, dos quais R$ 236 mil já foram depositados.

— Contribuímos para a revitalização de uma área de importância para a cidade, oferecendo cultura de alta qualidade, além de proporcionar a Porto Alegre o mérito de ser uma das poucas cidades do mundo com um cinema de rua em pleno funcionamento nos padrões técnicos mais atuais. Isso sem falar da questão da preservação da memória do audiovisual gaúcho — diz Andreia Vigo, diretora do Capitólio.

Exibindo filmes de fora do circuito comercial e promovendo sessões comentadas, o Capitólio adquiriu, em pouco tempo, um público cativo que chega a protagonizar filas do lado de fora. Andreia afirma não ter sido comunicada pela Petrobras sobre qualquer alteração no contrato:

— Neste momento, estamos no início do projeto patrocinado por eles para 2019, seguindo os trâmites normais.

Beto Rodrigues, diretor-presidente da Fundacine RS, entidade captadora de recursos para o Capitólio, aposta em uma relação duradoura com a estatal:

— A Petrobras está na origem da restauração do edifício. De certo modo, isso cria um vínculo mais sólido em comparação a eventos transitórios.

Indagada por ZH, a Petrobras se manifestou via assessoria de imprensa sobre o projeto: "O patrocínio ao Cine Capitólio Petrobras 2018-2019 está vigente e o atual contrato se encerra em 26/11/2019. Ainda não há definição sobre uma eventual renovação".

Dentro de um cenário de dificuldade para os festivais de cinema no país, o Festival de Gramado encerrou sua edição 2018 com orçamento de R$ 4 milhões, sem verba da Petrobras ou do BNDES, antigos parceiros do evento. O que fazer para reduzir o dano? A edição deste ano, orçada entre R$ 4,2 milhões e R$ 4,5 milhões, terá metade do custo financiado com o lucro do Natal Luz, segundo Edson Néspolo, presidente da Gramadotur:

— Com a retirada dos grandes apoiadores estatais, não temos aumentado a captação. Diferentemente de outros eventos de Gramado, o festival de cinema está estagnado.

Já o Cine Esquema Novo, festival dedicado ao chamado cinema experimental, teve em 2014 sua última edição com verba da Petrobras, conforme Ramiro Azevedo, um dos sócios do projeto. Para a edição deste ano, terá financiamento do Fundo Setorial do Audiovisual, uma categoria do Fundo Nacional de Cultura.

— Para projetos com viés mais comercial, é mais fácil buscar financiamento na iniciativa privada. Mas há outra gama de projetos com temas não atrativos para uma marca que dependem de recursos públicos. É função do Estado fomentar a cultura do país e disseminá-la nacional e internacionalmente — defende Azevedo.

Investimento estatal vem caindo nos últimos anos


Daqui para a frente, gestores culturais gaúchos ainda manifestam esperança de poder contar com investimentos de estatais em suas próximas edições, ao mesmo tempo em que mantêm planos B embaixo do braço. Uma possibilidade seria a busca por outros parceiros. Outra, uma readequação no orçamento. Ou, ainda, as duas coisas, como já fizeram a Bienal do Mercosul e o Porto Alegre Em Cena em 2018.

— A última Bienal teve zero real de Petrobras e BNDES. Quando as pessoas na sociedade percebem que o evento é importante, acabam surgindo alternativas. Tivemos um número maior de parceiros com valores menores — diz Gilberto Schwartsmann, presidente da Fundação Bienal do Mercosul.

A situação econômica do país foi um dos fatores que levaram a 11ª Bienal a ser adiada de 2017 para 2018. Mesmo assim,  teve orçamento reduzido. Foram R$ 4,3 milhões, pouco mais da metade dos R$ 7,8 milhões da 10ª Bienal, em 2015. Schwartsmann afirma que as primeiras 10 edições da Bienal tiveram verbas de grandes estatais. E espera poder continuar contando com elas:

— A Bienal não é apenas uma exposição. Há pessoas que gravitam em torno desse evento, que movimenta toda uma cadeia produtiva da cultura.

Também o Porto Alegre Em Cena teve de realizar em 2018 uma edição sem uma antiga apoiadora, a Petrobras. O secretário da Cultura de Porto Alegre, Luciano Alabarse, que esteve à frente do festival em quase toda a sua história e passou o bastão para Fernando Zugno em 2017, acredita que "não há tempo bom para a cultura", ou seja, que o setor sempre trabalha com "perdas e cortes":

— O Em Cena teve patrocínio da Petrobras desde a sua primeira edição. Eles vão conservar patrocínios de parcerias longevas ou não? Esse não saber é o que gera intranquilidade. Mesmo assim, o Em Cena foi realizado no ano passado com espetáculos relevantes e significativos. Temos de fazer um evento do tamanho dos recursos. É uma questão matemática.

Já a Feira do Livro de Porto Alegre foi o único projeto cultural gaúcho contemplado com patrocínio do BNDES em 2018. Foram R$ 300 mil, além de R$ 100 mil da Petrobras, que apoiou um eixo específico do evento, o Espaço do Conhecimento, com ações relacionadas a robótica, matemática e engenharia. A verba do BNDES para a Feira tem se mantido estável nos últimos anos, mas a da Petrobras vem diminuindo – em 2014, havia sido de R$ 390 mil.

Isatir Antonio Bottin Filho, presidente da Câmara Rio-Grandense do Livro, entidade que realiza a Feira, aposta na continuidade do apoio das estatais para a 65ª edição, no segundo semestre deste ano. Segundo ele, apenas de 30% a 40% do orçamento do evento é coberto por apoiadores constantes:

— A cada ano realizamos uma nova Feira, pois temos de buscar novos patrocinadores. No Brasil, ainda não construímos uma tradição sólida de apoiar eventos culturais. Sempre temos que ir atrás, mostrar todo o projeto de novo aos parceiros.

Outro tradicional evento literário gaúcho, a Jornada de Literatura de Passo Fundo contou com Petrobras e BNDES em 2011, teve apenas a Petrobras em 2013 e ocorreu sem apoio de nenhuma das duas em 2017. Em nota, a Universidade de Passo Fundo informa que a 17ª edição, em 2019, está em fase de planejamento, e os patrocínios estão sendo discutidos.

Se os últimos anos têm sido de dificuldades de financiamento, o setor cultural se vê diante de um cenário de incerteza no qual sobreviverá quem melhor se adaptar. Mas esse parece ser apenas o início da história.



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