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Shana Müller: Um grito de amor à terra

Mais uma vez, fui cantar na Fiesta Nacional Del Chamamé, em Corrientes Capital, na Argentina. Já são 10 anos por lá, representando Rio Gr...

Mais uma vez, fui cantar na Fiesta Nacional Del Chamamé, em Corrientes Capital, na Argentina. Já são 10 anos por lá, representando Rio Grande e Brasil e mostrando nosso jeito de fazer chamamé, cantando em português e espanhol e percebendo o conceito de integração por parte do evento ser efetivado a cada ano. Em 2017, por lá andaram Luiz Carlos Borges (claro, nosso embaixador chamamecero!), Cesar Oliveira e Rogério Melo, a Família Guedes (estivemos juntos na primeira vez em que fui ao evento), a Família Ortaça, o Paulo Mendonça apresentando, entre outros, inclusive do Mato Grosso do Sul e de São Paulo, por onde o ritmo tem também seus adeptos. Ousei um dia dizer que o chamamé talvez seja o gênero musical que está na música regional gaúcha e que mais brasileiros nos torna.

Em Corrientes, mais do que música, chamamé é conceito de vida. Dizia um amigo que conheci este ano, pegando a terra do chão: "Essa terra é chamamecera, chamiga". Sim, eles têm até uma maneira particular de chamar os amigos.

Pela primeira vez, fui conhecer as programações do entorno da festa. Bailantas chamameceras, com sol a pino e 40 graus no termômetro, não intimidam os amantes da música de bailar no chão batido de um camping a beira da lagoa em São Cosme, terra natal de um do grandes chamameceros: Mario de Transito Cocomarola, autor de clássicos como Kilometro 11.

A gente olha, tenta entender e questiona por que aqui é tão difícil de reunir mil, 5 mil pessoas num evento cultural, num festival de arte nativa, por exemplo. Lá são 10 dias e noites de festa com público de 10 a 20 mil pessoas que assistem durante horas às mais de 20 atrações de todos os cantos do país, da Província e do mundo que se reúnem para exaltar esse canto de amor pela terra, pela natureza, pelos rios, pela "Taragui" Corrientes e para manter vivas manifestações que perpetuam a identidade daquelas pessoas, como a própria língua guarani.

Este ano que passou, numa visita do amigo correntino Antonio Tarrago Ros a Porto Alegre, descobri que nem sempre foi assim. O festival nasceu como uma resistência, uma exaltação à própria historia do lugar. Teve meia dúzia de gatos-pingados nas primeiras edições. Solidificou-se e encontrou um ponto fundamental de todo e qualquer evento: comunicar -se com a comunidade.

Só indo lá para entender mesmo, mas dá uma inveja e um desejo profundo desse entendimento de pertencimento que eles têm e manifestam num aplauso, no simples ato de levantar entre as arquibancadas e dançar ou gritar um "sapucay" que, cada vez que a gente vai lá, percebe que nada mais é do que uma declaração de amor.


Fonte: Coluna "Pampianas" de Shana Müller junto ao jornal Zero Hora

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