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Crônica: A aura de setembro

Por Pablo Rodrigues... O vinte de Setembro passou, data máxima para os sul-rio-grandenses, data que serviu de inspiração para forjar nos...


Por Pablo Rodrigues...

O vinte de Setembro passou, data máxima para os sul-rio-grandenses, data que serviu de inspiração para forjar nossa identidade, tanto é que muito se confunde, dizendo estes que o dia 20 de setembro é o dia do gaúcho. Bem, até que pode ser se pensarmos pelo lado gentílico da palavra a qual nos atribuíram justamente por vivermos na terra dos gaúchos.

Bueno, voltando ao setembro me “quedei” pensando acerca de tantos outros fatos ocorridos neste bravo mês e me pareceu que o setembro, realmente fora feito para os gaúchos (ou sul-rio-grandenses, como preferirem).

O primeiro que se recorda é exatamente o dia 20, invasão de Porto Alegre pelas tropas rebeldes e estopim da Revolução Farroupilha, não me deterei nas motivações, pois elas foram diversas, mas o que posso dizer é que a dita revolução foi movida pela indignação. E esta indignação que sempre permeou a imagem do sulino se traduziu em nossa marca, o que hoje em dia parece não dizer muita coisa, pois parecemos atolados em um varzedo, lembrando do passado rebelde... e como historiador me pergunto: De que serve o passado se não para inspirar o futuro? Enfim, apenas uma reflexão em meio deste setembro...
 

 


 
 Setembro ainda nos reservaria um dos dias mais especiais da história da América, o dia em que uma Província resolveu desafiar um Império e tornar-se uma República. É claro que uma República com os moldes da época, não no modo como a concebemos hoje em dia, mas nascia no dia 11 de setembro de 1836 a República Rio-grandense. Este dia sim mereceria um feriado, com comemorações, desfiles, fazer o Brasil lembrar que o tratado de Ponche Verde apenas deu fim a guerra e não ao sonho republicano de Neto, mas parece que nós mesmos esquecemos disto, esquecemos até do pacto federativo que é muito mais recente, de certo modo, nos rendemos ao centro do pais, mas ainda bem que temos o setembro para rememorar nossa galhardia...

Por falar em galhardia, porque não se lembrar do dia 30 de setembro de 1930, início de mais uma epopeia protagonizada por “chimangos” e “maragatos”, agora na denominada FUG (Frente Única Gaúcha). Unidos, os sul-rio-grandenses levaram Getúlio Vargas ao poder e ainda de quebra ataram a cavaleada naquele tal de obelisco da Avenida Rio Branco (tenho um sonho particular de ainda tirar uma foto lá). Mas então, por falar em Getúlio Vargas, este distinto filho de São Borja se mostrou um grande estadista, aprendeu direitinho nas fileiras do antigo Partido Republicano Rio-grandense como se fazia política com mão de ferro, lembrem que foi ideia dele a criação de partidos nacionais (com isso a centralização da política brasileira) e da queima das bandeiras estaduais, para o Gegê, o Brasil era único e as tradições regionais deveriam ser esquecidas, a começar pelas bandeiras.

Mas algo soa estranho, como esquecer das tradições regionais se o próprio Getúlio seguidamente posava para fotografias ostentando suas largas bombachas? Como todo político, Getúlio também tinha suas contradições e talvez seja essa uma das características mais marcantes no velhinho, a contradição.

O dia 30 de setembro de 1930 possui outro fato interessante, embora seja de menor expressão que a chamada “Revolução de 30”, a morte do “Tropeiro da liberdade” (ou “Leão do Caverá”, como preferirem. Prefiro o primeiro apelido pois o segundo já tinha dono, o coronel Maneco Machado. Honório apenas herdou de seu antigo chefe o apodo por ter também um exímio conhecimento das serranias do Caverá).
 
Honório Lemes com a sua família

Honório Lemes da Silva veio a falecer justamente no dia que mais esperava, o dia em que uniria forças com seu antigo antagonista, o general Flores da Cunha e juntos marchariam em prol de um ideal em comum. O velho tropeiro jamais imaginaria que mesmo não participando deste fato de extrema magnitude para a história brasileira, ficaria para sempre na memória e história do Rio Grande do Sul.

É impossível (ao menos para mim) sair de Rosário em sentido a Livramento e não dar aquela olhadinha à direita, em sentido ao Alegrete para enxergar a velha Serra do Caverá. Ou ir a Rosário e não pensar no velho Honório. A primeira vez que visitei seu jazigo e vi aquele lenço vermelho dentro da pequena capela que guarda os seus restos mortais me veio um sentimento de: - “Por que não nasci naquele tempo?”. Talvez seja mais um desses ufanismos românticos que insiste em permanecer em nós sulinos, mas acredito que se dosado na maneira certa, não faz mal a ninguém, bem pelo contrário, só faz bem.

Terminando este “setembrismo”, remonto o ano de 1904 e trago um tal de “general de duas pátrias”... A última guerra civil uruguaia se afunilava a um ponto sem volta, era vencer ou vencer (tanto para blancos ou colorados), eis, que por um golpe do destino o bem traçado plano blanco vai por água abaixo, ou melhor, uma bala abaixo.

Na localidade fronteiriça de Masoller, Aparício Saraiva (o Saravia para loshermanosorientales) é baleado no dia 1° de setembro de 1904, passando dias em delírio (não sou eu quem está dizendo, o próprio filho de Aparício, Nepomuceno é quem disse em sua obra “Memorias de Saravia”), acaba por falecer em solo sul-rio-grandense a 10 de setembro na estância da senhora Luiza Pereira, mãe do famigerado João Francisco Pereira de Souza.

A morte de Saraiva acabou por dar fim à guerra, pois aquela era nitidamente uma revolução do próprio Aparício, sendo assim, o caudilho morto, a guerra perdia seu sentido. Porém, a luta de Saraiva perdurou por anos e ainda perdura se levarmos em consideração a tendência política que leva seu nome no Partido Nacional.
 
Busto do General de Duas Pátrias em Livramento - Foto Matias Moura


O que me chama atenção, é como a imagem de Aparício se imortalizou (vide a quantidade de estátuas e pinturas que representam o caudilho. Quem tiver a oportunidade de ir a Livramento, dê uma voltinha na Praça Internacional que lá estará ele entremeios, metade Rio Grande, metade Uruguai). Tudo bem que após a morte de Gumercindo, Aparício se tornou o general em chefe da Revolução Federalista e que depois “incendiou” o Uruguai com seus reclames para uma maior participação de seu partido na política quase que unilateral sob a regência do Partido Colorado. É justo que se façam inúmeras homenagens e que se estude o porquê de seus feitos, o injusto, ao menos no meu ver, é deixar seu irmão mais velho em um ostracismo seja ele historiográfico ou referente às homenagens, se não me engano, em Santa Vitória do Palmar existe uma escola com o nome de Gumercindo Saraiva e agora pasmem, em São Paulo capital existe uma rua com o nome de um dos maiores gênios da estratégia militar que este país já conheceu.

No Uruguai, o nome de “Gumersindo Saravia” é nome de rua em diversas cidades em diversos departamentos, então eu me pergunto: - O que falta para o “Napoleão dos Pampas” ter o mesmo reconhecimento? Será que ele precisava também estar marcado pelo setembro?

A questão talvez nem seja tão interessante, pois temos tantas personalidades e tantos feitos marcantes, que nem o setembro possa suportar, aí resta a nós, orgulhosos do jeito que somos, render homenagens aos esquecidos que de uma maneira ou de outra foram relegados a um papel secundário, nem falo de Gumercindo que tem uma relevância importantíssima na nossa história, digo daqueles a quem o setembro tratou de esquecer. Dos lanceiros negros, verdadeiros revolucionários, pois acreditaram em uma mudança que realmente significaria algo para as suas vidas e de seus familiares, o que dizer então dos chamados “índios de Aparício”, Alguém sabe me dizer o nome de algum deles? Só sabemos que seu lema era: “Aire libre y carne gorda”; E a paisanada que seguia o general Honório Lemes, homens como ele, voltados às lidas do campo e que talvez vissem em seu general um bom motivo para terem seus anseios atendidos. Digo o mesmo dos seguidores de Getúlio Vargas ou dos capatazes de sua estância, o que será que pensavam estes homens?

Talvez não nos seja possível resolver todas estas proposições elencadas ao longo do texto, mas não custa nada reservar um pouquinho do setembro para lembrar que o Rio Grande do Sul é muito mais do que isso e que não nos chamam de gaúchos à toa.

Pablo Rodrigues Dobke.
Bacharel em História (UFPel).
Mestrando do PPGH (UFSM).
Bolsista FAPERGS - Linha de Pesquisa: Integração Política e Fronteira.
Membro do Núcleo de Etnologia Ameríndia (NETA - UFPel).


Fonte: Rádio Fronteira Gaúcha

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